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Última saída?

Dr. Rodrigo José Ramalho


A Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo publicou recentemente o estudo Demografia Médica Brasileira 2025, em parceria com a Associação Médica Brasileira. Esse estudo é o maior já realizado sobre a realidade da nossa profissão e traz à tona números impressionantes.

Em 2035, estima-se que o Brasil terá cerca de 1.152.230 médicos ativos, mais que o dobro do número atual. Esse número é o reflexo de uma política permissiva de abertura desenfreada de “escolas médicas”, sendo nossa pátria mãe gentil o país com o maior número de escolas no mundo: 448! Como se isso fosse pouco, ainda restam 177 solicitações judiciais interpelando o Ministério da Educação para serem abertas! A pergunta primordial a ser feita é se temos mão de obra qualificada, ou seja, um conjunto de professores capacitados (especialistas, mestres, doutores) para dar conta desse número...obviamente a resposta é não! Não temos! Quem sofrerá as consequências de uma mão de obra desqualificada? Todos nós!

Outro dado publicado chama a atenção sobre o comércio de “escolas médicas”: 21% das vagas nos cursos de medicina pertencem a grupos financeiros listados na bolsa de valores. Nada contra a aferição de lucro e a prosperidade mercantilista liberal, mas não acreditamos que a maior preocupação dos grupos controladores seja com a qualidade do ensino ou o perfil do egresso que estão formando...

Mas nossa situação piora mais quando analisamos a “pejotização” da profissão. Hoje 66% dos vínculos trabalhistas são por empresa, fragilizando as conquistas sociais e expondo por exemplo as mulheres, maioria na nossa profissão, perdendo garantias básicas como férias, décimo terceiro e licença maternidade. Ainda, com a proliferação dos convênios predatórios na saúde suplementar e o maior número de médicos no mercado, haverá redução nos salários e a “uberização” da medicina estará completa. A renda média em 10 anos caiu de R$ 39.742 para R$ 36.818, o que à primeira vista parece plausível. Porém a inflação no período foi de 66,4%, sendo o valor corrigido esperado de R$ 61.000! Portanto a perda real no salário é expressiva e significativa, em que pese as ponderações comparativas com outras profissões e a situação social terceiromundana em que vivemos.

Daí a importância de ser regulamentada a lei de proficiência médica no país. Incapazes de obstruir a criação das “escolas médicas”, nos resta lutar para a qualificação apropriada dos egressos, com a obrigatoriedade de se comprovar a capacidade de exercer a medicina e não colocar vidas em risco. Acredita-se que a publicidade dos resultados possibilitará uma auto-regulação do mercado médico, levando ao fechamento das ofertas em faculdades ruins. É a nossa única saída. E talvez a última. 

Dr. Rodrigo José Ramalho, presidente da Associação Paulista de Medicina Regional de Rio Preto