Fragmentado
Dr. Rafael Delsin
A especialização nasceu da
necessidade frente à expansão e à diversificação do conhecimento médico, fruto
do progresso científico e tecnológico. Atualmente, a Medicina está cada vez
mais dividida em especializações, embora seja comum ouvir que elas diminuem a
visão holística de cada paciente. Na Antiguidade, alguns milênios antes de
Cristo, os egípcios já possuíam médicos especialistas como comprovam os
papiros. Havia, por exemplo, os que cuidavam de moléstias oculares e que
realizavam cirurgia de catarata. Na Grécia, berço do racionalismo, e em Roma,
não havia especialistas como entendemos hoje. Os médicos exerciam a
clínica/cirurgia concomitantemente.
Após a queda do Império Romano, em 476 d.C., o conhecimento
médico ruiu e teve uma evolução quase nula. A medicina ocidental passou a ser
exercida em conventos da Europa, protegida por monges que se limitavam ao que
havia sido transmitido por Hipócrates e por Galeno. Dentro dos conventos,
praticava-se a clínica e alguns procedimentos cirúrgicos. O panorama começaria
a melhorar ao final da Idade Média e a partir do Renascimento, com o surgimento
das faculdades e universidades de medicina na Europa. Vale lembrar que a
presença e a influência dos árabes na Europa Medieval, a partir do século VII,
gerou avanços na Medicina. Os hospitais árabes eram superiores aos ocidentais
nesta época em higiene, limpeza e organização. Alguns eram divididos em áreas
para doenças abdominais, cirurgia, dermatologia, oftalmologia, doenças
psicológicas, ossos e fraturas, entre outras.
A tendência à especialização como a conhecemos atualmente
iniciou-se a partir do século XVIII, com avanço da ciência em todos os campos.
Os novos estudos e descobertas ampliaram em muito os horizontes da Medicina. As
especialidades surgem, então, como fruto da evolução do saber, pois o homem, na
brevidade de sua existência, não teria mais possibilidade para dedicar-se
integralmente a todos os ramos da ciência. A Cardiologia nasce naquele século
com os trabalhos de Giuseppe Testa, na Itália; mas foi o clínico francês Jean
Corvisart o primeiro especialista em coração, tendo sido médico de Napoleão
Bonaparte. No mesmo século, nasce ainda a Obstetrícia, a Pediatria e a
Endocrinologia. Os estudos sobre a natureza física da luz e as cores
proporcionaram o aparecimento da Oftalmologia (em 1773, em Viena, é fundada a
primeira escola de oftalmologia). Outras especialidades foram aparecendo no
decorrer do século XIX.
No começo do século XX, após a Primeira Grande Guerra,
observou-se a necessidade de formação de profissionais dedicados à reconstrução
corporal. A Cirurgia Plástica, que já vinha sendo exercida desde os primórdios
da humanidade, torna-se uma especialidade. O avanço tecnológico do século XX
multiplicou as especializações, provocando o surgimento de muitas ligadas aos
novos aparelhos, como a Radiologia, a Endoscopia, a Medicina Nuclear e a
Medicina de Tráfego, por exemplo.
No Brasil, até meados do século XX, não havia ainda uma
regulamentação específica nesse sentido. A Residência Médica só aparece a
partir dos anos 40. Hoje, segundo a Resolução n° 2.221/2018 do Conselho Federal
de Medicina (CFM), são reconhecidas no Brasil 55 especialidades e 59 áreas de
atuação (que são, na verdade, subespecialidades). A norma foi definida por um
consenso entre o CFM, a Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM) e a
Associação Médica Brasileira (AMB).
O nostálgico médico de família, que adentrava os lares e
cuja simples presença era fator de cura, tem seu lugar e sua notável
importância garantidos, tanto que figura entre as especialidades reconhecidas,
a Medicina de Família.
Claro que todos podemos (e devemos!!!) semear a
característica mais marcante do antigo médico de família: o carisma gerado pela
empatia, carinho, dedicação e amor que ele tratava seus pacientes e que inspirava
a confiança e o respeito de todos. Cada um de nós pode cultivar a aura do
médico de outrora, apoiando-se no mais perfeito relacionamento médico-paciente
(tão esquecido nos dias de hoje), a despeito de toda e qualquer evolução
científica. A pedra angular permanece alicerçada nos mesmos e imutáveis
princípios primordiais.
Dr. Rafael Delsin é 1º secretário da APM – Regional de Rio Preto