Artigos

Editorial - Dia do Médico – Dia de São Lucas (médico de homens e de almas)

Prof. Dr. Domingo Marcolino Braile (“in memoriam”)

 A autora Taylor Caldwell levou mais de 40 anos para escrever o livro “Médico de Homens e Almas", cujo nome original em inglês é “Dear and Glorious Physician”. Nele, conta a história de São Lucas, nosso Santo protetor e Médico dos médicos. São Lucas, cujo nome era Lucano, viu a estrela de Belém, anunciando o nascimento de JESUS. Nunca conviveu com nosso SALVADOR, mas escreveu um dos mais lindos Evangelhos, o “Evangelho segundo São Lucas" e o "Ato dos Apóstolos”. Desde jovem recebeu a função divina de curar, aprendendo a arte com seu mestre Keptah. Estudou depois na universidade, tomando-se médico milagroso. Conviveu com São Paulo difundindo a fé cristã.

A oportunidade de ressaltar a importância da Medicina como um dos pilares mestres para o desenvolvimento de nossa cidade é, para mim, sempre motivo de alegria, satisfação e muto orgulho.

A Sociedade de Medicina e Cirurgia de São José do Rio Preto, fundada há 97 anos, em 1926, muito antes da Associação Paulista de Medicina, representou, desde seu nascedouro, um fórum avançado da elite pensante, fincada nos sertões por ainda serem conquistados deste imenso país. No início da década de 60, quando aqui me fixei, a Sociedade era um centro de grande atividade intelectual, não se restringindo às atividades apenas científicas, razão principal de sua missão. Numa visão de vanguarda, já se preocupava com a difusão dos conhecimentos na sua forma mais ampla e abrangente. O incentivo à cultura e o acesso às artes, essencial para a percepção holística da humanidade, eram tratados de forma especial, para que, mesmo afastados dos grandes centros, pudéssemos manter nossa erudição a altura dos que estavam mais próximos das fontes criadoras. Com a qualidade de iniciativas pioneiras e muta informação, a Sociedade mantinha a classe médica unida em tomo dos seus ideais. Esta herança permeou os anos e permanece até hoje, com a seriedade que a caracteriza. Do seu seio nasceu, por vontade dos médicos, a Famerp, com a mesma qualidade e o mesmo sentido de produção e difusão do conhecimento.

Não creiam, contudo, que a tarefa foi fácil. A sorte nos brindou com pioneiros do mais alto gabarito. Profissionais que para cá vieram na virada para o século passado, trazendo o cabedal de conhecimentos que tomou Rio Preto, desde então, num grande centro de atendimento médico, atraindo doentes de todas as regões do país. Citarei aqui figuras antológicas de um passado que poucos recordam, fazendo-o sem o rigor que mereceria, pois, por cento, a memória me trairá. Mesmo correndo esse risco, relaciono alguns dos nossos colegas que sempre povoaram o cenário dos grandes médicos em minhas lembranças: Dr. Cenobelino de Barras Serra, que foi colega de Lênin na Alemanha e veio para Rio Preto para ser um grande cirurgião, além de político sagaz, tendo sido eleito prefeito da cidade por mais de uma vez.

Dr. Gilberto Lopes da Silva, outro cirurgião na verdadeira acepção da palavra, e que mantém até hoje seu nome e sua fama pelos méritos dos seus descendentes. Como o Dr. Cenobelino, ele também foi prefeito da cidade.

Dr. Mano Valadão Furquim, pediatra com formação internacional, um dos iniciadores da especialidade no Brasil.

Dr. Sinésio de Mello e Oliveira, grande oftalmologista, de formação esmerada, que sempre se dedicou às causas sociais da comunidade. Foi presidente da nossa Sociedade e, como os anteriores, prefeito de Rio Preto. Seus descendentes deram continuidade à sua saga, mostrando seu amor pela profissão que abraçaram.

Dr. José Maria Rolemberg, oftalmologista de grande prestígio, deixou o importante Instituto Burie, de Campinas, do qual foi um dos fundadores, para desenvolver sua atividade incansável em nossa cidade. Seus filhos e netos prosseguiram sua obra contribuindo com seu trabalho, não só no campo médico, mas também como líderes associativos, dando grande impulso ao progresso da cidade e da nossa Sociedade Médica.

Dr. Oscar de Barros Serra Dona. cirurgião maiúsculo que fez de Rio Preto um centro de atenção pela sua destreza e criatividade. Foi incentivador incansável dos jovens e um idealista a toda prova. Se hoje temos o Hospital de Base, devemos aos seus ousados sonhos. Deixou-nos cedo, mas seus filhos e netos são a memória viva da nobre profissão que herdaram de um ascendente ilustre.

Muitos outros deveriam ser reverenciados, porém, tomo a liberdade de criar apenas estes, homenageando assim todos os companheiros que transformaram Rio Preto no centro médico de excelência que é hoje.

Para enriquecer a narrativa histórica, cujos primórdios foram decisivos para a cidade ser hoje referência nacional em tantas especialidades, transcrevo, a seguir (leia à página 4), trechos, livremente adaptados, de um texto escrito pelo meu pai, também médico, que aqui chegou nos idos de 1929, exercendo Medicina de "corpo e alma”, trabalhando na profissão amada até ser chamado a exercê-la em outra dimensão, na provecta idade de 86 anos. Trata-se de um Editorial, elaborado por ele, e publicado na edição inaugural da Revista da Sociedade de Medicina e Cirurgia de Rio Preto, datada de janeiro de 1968.

O texto joga luz sobre as dificuldades enfrentadas pelos pioneiros deixando evidente que o sucesso de nossa Medicina sempre foi construído com muito sacrifício, bravura, abnegação e coragem. O esforço e a dedicação de médicos que se sagraram heróis no início do século passado são tão valorosos como as lutas e as dificuldades que até hoje muitos heróis, anônimos embatem para preservar e solidificar a força e a competência da Medicina de uma Rio Preto que, cada vez mais, se agiganta e ganha ares de metrópole.


Dr. Domingo Marcolino Braile, Médico, Professor Doutor, Livre-Docente de Faculdade de Medicina de Rio Preto e Unicamp.