A tragédia e a misericórdia
Dr. Ricardo Lima Garcia
Nesses últimos dias, em qualquer lugar que se vá neste país, fala-se sobre a tragédia que assola o estado do Rio Grande do Sul. Nas minhas quatro décadas de vida, não presenciei, no nosso país, tamanho desastre natural. Sempre escutei que uma das melhores coisas do Brasil é que a natureza sempre foi benéfica aqui. Não temos problemas com terremotos o Chile ou o Japão. Não temos vulcões como a Itália, que tem Pompéia como marco de desastre natural acometendo aquela cidade. Não temos furacões como o Katrina que acometeu New Orleans.
Talvez por essa infrequência destes eventos aqui, fomos tão surpreendidos.
Fui surpreendido pelo desastre natural, mas também pela rede de solidariedade vinda de diversos locais, classes sociais e culturais neste país.
Obviamente, o brasileiro não é perfeito, existem malfeitores que conseguem aplicar golpes, mesmo usando essa desgraça que acomete o povo gaúcho, mas tenho notado que é uma minoria que está sendo ensurdecida pela maioria esmagadora de benfeitores e seus atos.
A história nos mostra que toda tragédia não acontece em um ponto isolado, vai como uma árvore comprometendo seus ramos. E neste texto, venho lembrar destes nefastos ramos que muitos esquecem.
A água vai embora, em um momento, será drenado, mas a sequelas dos alagamentos ficarão. Não temos ainda ideia do tamanho das perdas relacionadas à essas chuvas na região sul do país.
Plantações inteiras destruídas, indústrias destruídas, moradias destruídas, e gerará todo um comprometimento sistêmico por isso, com fome e pobreza alastrando por toda aquela região.
O comprometimento do sistema de saúde local é nítido, no qual aumenta o risco de doenças relacionadas a higiene, como leptospirose, diarreias, ou intoxicação alimentar, entre outras. E nestes momentos que pessoas mais vulneráveis mais sofrem, tanto fisicamente como psicologicamente. Cabe tanto ao estado quanto aos movimentos civís tentarem contornar ou minimizar tal celeuma, mas não será fácil.
Carecerá de recursos humanos, financeiros e estrutural, isso é certo, e continuará por um tempo necessitando do assistencialismo e boa vontade do restante deste misericordioso país.
Dr. Ricardo Lima Garcia é médico ginecologista e obstetra e associado da APM Rio Preto.
Foto: Ricardo Stuckert PR